Continuemos, pois, nosso encontro, como mencionado, em uma fazenda nos arredores de Piraju - SP, ainda a ruminar o tema "quem morre não volta para contar como é pra lá, seja céu, purgatório ou inferno.
Neste intervalo, dentre os presentes, como disse, em número de 8,se serviram de uma farta refeição, entre massas e molhos da mais fina espécie, aguçadores do sabor, mas, para o efeito deste registro, tanto faz ao leitor hajam eles comido caviar ou tutu de feijão.
Ponderaram entre si sobre o que foi exposto e teceram comentários por mim esperados. Pessoalmente, a mim foi de grande valia ouvi-los e, melhor ainda me agradou ouvir a aprovação da maioria para com minha despretensiosa exposição.
Eis alguns argumentos colocados pelos bondosos ateus:
Ateu 1 - De fato, essa limitação dos sentidos físicos realmente precisa ser levada em conta. Ninguém é capaz de ouvir todos os sons nem a visão, por mais privilegiada, captar todas as cores. Mas seria exigir muito de nós, aqui presentes, acreditar na existência de espíritos que já deixaram este mundo ou anjos que aqui desçam para bater suas asinhas e presenciar nossa conversa.
Pois bem, fica a evidência, diante de todos, que quem está falando em espíritos e anjos é o senhor. Para lhe ser franco, sou tão desconhecedor desse conhecimento de causa quanto cada um de vocês. Eu não sou médium, não sou vidente nem clariaudiente.
Não vim aqui para materializar fantasmas ou coisas parecidas. Só mantenho o escopo de, nesta oportunidade, descobrir em cada um dos senhores a razão de sua descrença.
Porque não vejo muita vantagem trocar um fanatismo - por credulidade, por outro tão inconsistente quanto o da incredulidade pura e simples.
Vocês percebem que estou a evitar, o máximo possível, entrar com citações feitas por autores realmente consagrados sobre o tema "espiritualidade".
Se essa fosse a proposta, eu traria aqui os livros - todos entre os senhores são alfabetizados e, certamente, teriam o poder de compreender o que estivesse escrito a respeito da alma, da imortalidade da alma. Do Espírito. Da existência de um Creador. Mas não é este o caso.
Aqui estou completamente desmuniciado. Até a memória de minhas leituras e lições aprendidas deixo inativas para o que hoje me parece esse desafio que os senhores me lançam.
E se me for dada a graça de convencê-los, pelo menos, de que o ateísmo ortodoxo e radical de cada um de vocês, é uma postura mais de comodidade mental do que propriamente de convicção, dar-me-ei por satisfeito.
Por bem pago já me dou, porque cada qual compareceu com o pagamento pelo meu trabalho em aqui estar para a missão de falar-lhes, na medida do avençado, o que muito me agrada sob todos os aspectos.
Há entre os descrentes e os crentes - vamos dizer assim - algo que mais os aproxima do que os distancia. Aliás, há dois tipos de descrentes: os ateus (que não creem em nada), e os agnósticos (que até admitem a existência de um mundo invisível e um Creador, mas que consideram esse mundo inatingível, incompreensível, longe mesmo até da lógica a que estamos acostumados.
Ateu 2:
Parabéns. Agora gostei do que você disse. E eu pergunto: será que os que se dizem crentes e piedosos, realmente sabem no que estão crendo e reverenciando? Possivelmente, eu seja não propriamente um ateu, mas, sim, um agnóstico. Principalmente quando me falam em oração. Dá para se admitir que alguém possa ordenar, ao suposto Ente que ele diz crer, o que esse Poder - que segundo os crentes pode tudo - fazer o que ele pede, aliás, manda? Ainda mais se levar em conta que se desenha Deus como sábio. Se Ele sabe tudo, o que tenho eu que xeretar em dizer a Ele para fazer isto ou aquilo?
- Suas palavras enriquecem este encontro. Parabenizo-o pela força de sua lógica, extraída mesmo dos próprios postulados em que se fincam as pessoas que se dizem crentes.
Contudo, o que percebo - cá entre nós - até mesmo por nossa conversa informal ocorrida ali na cozinha - é que os senhores, no fundo, torcem para acreditar. São sinceros e autênticos. Vocês não têm vergonha de serem humanos, e isto é um ingrediente importante para uma vida onde há verdade e respeito a si mesmo.
Não esperem vocês, deste simples palestrante, que eu lhes mostre num passe de mágica que a espiritualidade é mais real do que a própria realidade. Esta concepção filosófica a que cheguei, é só minha, e não pretendo incutir essa forma de entendimento a quem quer que seja.
Na primeira parte desta exposição, os senhores até interpretaram que a mesma mais se prestava ao humor do que à preocupação em convencê-los da existência de algo mais do que o que se vê.
Felizmente, pelo que avaliei, levaram a sério e, cultos como são todos os senhores, sem exceção, pelo que aprenderam no ensino regular e nas leituras, foram unânimes em concordar sobre a espantosa estreiteza de nossos sentidos para captar a realidade circundante.
Mesmo a material, ou energética. Imaginemos então como será tentar se ocupar sobre o mundo dito sobrenatural, que desafia a nossa própria razão e até a nossa imaginação.
Estou ciente que este lembrete - digo lembrete, porque cada um dos senhores sabem sobre esses limites de nossos órgãos dos sentidos, foi um passo para deixar margem, em seus corações e mentes para o que podemos nomear como mistérios e, como tais, impossíveis de serem colocados em palavras.
Todo ser humano é um anjo. De duas asas. Uma delas se chama Razão. A outra, se chama Fé. Assim como não se pode discriminar uma pessoa por ser desprovida de razão.
Por ela acreditar em coelhinho da páscoa, papai noel e outros seres lendários, não significa que mereçam ser depreciadas como pessoas inferiores aos dotados de razão.
Nossas crianças - aliás nem elas hoje acreditam nisso - mas fingem acreditar apenas para ganhar ovos de Páscoa e presentes no Natal. Porém, - bem entendida a comparação - não faltam pessoas crédulas em coisas e seres inexistentes. Isso aconteceu e acontece em todas as civilizações e em todas as épocas.
- Outro aspecto que leva as pessoas à descrença ou ceticismo é confundir espiritualidade com religião. E, mais ainda, com os religiosos de plantão. Em todo grupamento humano existem problemas.
A fraqueza está em toda parte, nos indivíduos e depois - na soma - se fixa nos grupos, até mesmo - (e sem nenhuma diferença) em grupos religiosos.
Isto é fatal até mesmo nas Escrituras - ditas Sagradas, onde seria fastidioso enumerar tantos disparates, práticas inconcebíveis como sacrifícios de animais para propiciar sacrifícios por pecados ou desvios humanos, em certa época da história da humanidade.
- São práticas que desafiam a lógica - tanto a lógica terrena e mais ainda a lógica presumivelmente transcendental - que bem se justifica o fato de pessoas como os senhores não se dar ao trabalho sequer de pensar sobre tudo isso sem uma total desconfiança.
Aliás, até se julgam ofendidos em sua boa fé, porque são pessoas que, ao seu modo, procuram viver o aqui e o agora. Só que há uma outra questão.
O "aqui e agora" a todo momento muda de tempo e lugar. Não há como não cogitar. Não há como anular por completo esses questionamentos.
Até porque certas pessoas que se dizem ateias, no fundo, o que mais queriam era que, para elas, realmente Deus existisse. Porque ao mesmo tempo, contemplando o mundo de forma prática, nua e crua, pelo menos tudo conspira para que essas pessoas creiam que o Bem não prevalece na Terra. É ou não é?
Ateu 8 : Matou a pau. Pelo menos para mim é isso o que acontece. Porque se um Bom Deus fez o mundo, o Universo - como querem os místicos -, qual o porquê de tanto mal, miséria, fome, transtornos, furacões, terremotos; milhões de pessoas mortas de uma hora para outra, como foi o Terremoto em Porto Príncipe, no Haiti?
- Não saberia como lhe apresentar o Bem como prevalecente no mundo. Todavia, posso entrevê-lo na sua própria pergunta. A sua preocupação com milhões de pessoas, que você nunca viu pessoalmente (a não ser pela mídia) é uma evidência de fraternidade que se faz confessa sem nenhum esforço.
Estamos no caminho certo deste encontro. Diante dessas hecatombes você e milhares de pessoas se estarrecem, desejam uma realidade diferente da que aí está.
E isto se resume em esperança, em certeza de que o Bem que você anuncia como ausente, está aqui bem pertinho, no seu próprio coração, a clamar por um Deus que você diz não acreditar que exista.
(segue no próximo bloco
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