RECUSOU PÃO E ÁGUA

PIDONCHO DE BARRIGA CHEIA


Fins da década de 1960 (do século passado). Contando então vinte anos de idade, mudei-me para Paraguaçu Paulista por motivos estudantis e profissionais. 

Por esse tempo, nessa cidade havia  muitas casas de madeira e, não raro, uma privada no fundo do quintal. Geralmente ficava longe da porta da cozinha, como é de boa praxe para efeitos higiênicos.

Minha avó, Dona Benedita, com quem então eu morava num desses domicílios de antanho,  sempre foi uma mulher caridosa. Dar de comer a quem tem fome para ela se tratava  de um mandamento divino. 

Eis senão quando aparece, numa tarde em que vovó acabara de assar pães, um mendigo lá no fundo, do outro lado da cerca, perto da privada e interpela-a:


- Oi, Dona... – chamou alguém com aparência de  mendigo, ainda que de feições coradas.


Vó Benedita, mais que depressa, tomou de meio pão caseiro, ainda quente,  e foi em  socorro da fome do peregrino que chegara em boa hora. No instante em que ela estendeu-lhe o pão, embrulhado num papel, pois estava saindo do forno, ele disse numa voz sufocada:

- Ai, minha senhora. O povo de Paraguaçu  é muito bom e me entrouxou de comida. Perdoe-me, mas eu dispenso o pão.  O que quero, por caridade, é que a senhora me dê somente o papel e me deixe usar esta privada aqui.


Não com tanta boa vontade, vovó acedeu ao pedido e já ia indo abrir o portão quando o mendigo apurado  saltou pelo balaústre como um pássaro em fuga e, sem  tempo de fechar a porta, esvaziou da barriga o fruto de suas petições  pela cidade.

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