ANTIGAS CARTAS DE AMOR



CARTAS DE AMOR

Um texto de Geraldo Machado –


No livro Na Garupa  da Memória,Que nos deu a honra de prefaciar.





A minha geração ainda alcançou a correspondência epistolar. Não havia a facilidade do telefone e as distâncias eram bem maiores. Quem morava na cidade ou vila do interior e, mormente, no meio rural, se valia do correio para se aproximar e obter notícias. Muita gente não sabia escrever.

Usava a vizinha ou a prima que tinha “boa leitura e boa mão de pena”, para escrever e responder às cartas. Lembro-me bem de uma vez escutar uma moça dizer à outra , gabando o seu namorado: “Você carece de ver as missivas dele”.

 Comprava-se nas livrarias, caixa de papel de carta, especial, de luxo. Dava-se de presente. O envelope de fino lavor, era forrado em cores, de um papel de seda muito fino. Alguns já vinham perfumados. 

Tinham iniciais, monogramas. Quando havia luto, o papel e o envelope traziam uma tarja preta, de pesar.


Os namorados mandavam cartas com pétalas de violeta, folha de malva ou trevo, prensados nas dobras. A prática da caligrafia (que vem do grego: belo, formoso, mais escrever, descrever, desenhar), era lecionada nas escolas. Nem todos têm a letra bela, formosa. Eu, de minha parte, não a tenho. Era costume da pessoa mais simples, mandar ou começar cartas com lugares- comuns, tais como: 

Escrevo estas mal traçadas linhas... Eram chavões muito pobres. Outros começavam com versinhos padronizados, como estes: Com pena peguei na pena/ Para com pena te escrever? Com pena larguei da pena? Para de pena não morrer.


 O compadre Bertolino das minhas histórias  recontadas, quando se via só, perdido no sertão do Paraná, pela mão alheia, mandava carta para o meu pai ir buscá-lo de volta para o sítio. Fugia da malária e da penúria. Terminava sempre assim, essa lamúria: Vai, cartinha saudosa/ Por esse mundo sem fim/ Dizer ao compadre Benedito/ Que não se esqueça de mim! Era uma graça. Meu pai munia o fordinho e ía ao sertão do rio Cinzas ou Laranjinha, buscar o compadre empaludado.




Todo rompimento de namoro implicava na devolução das cartas amarelas pelo tempo. Orlando Silva, o cantor das multidões, cantava uma valsa muito romântica, da qual me ficou este verso: “Hei de devolver os teus desvelos, cartas, rosas murchas, teus cabelos... “Velho tempo, em que o namorado guardava uma mecha do cabelo da amada!
           

  A espera do carteiro trazia muita emoção. Quantos casamentos confirmados por cartas! Quantos namoros desfeitos assim! Eu tive muitas cartas guardadas, desde os tempos em que eu estudava fora, cartas dos pais e – por que  fugir à regra ? – das namoradas e dos amigos da escola. Com o tempo me desfiz delas, amarelas e confidentes. Folhas caducas, outonais, da árvore frondosa da vida!   





            Mas a vida é ininterrupta em seu script e deu um passo com os tablets, os smartphones, os zap zaps e eu fiquei demodê com minha Parker tinteira.

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