UMA CARTA DE PERPÉTUO
AMOR
Em 15 de
fevereiro de 1974.
Minha
querida Namorada,
Tanto quanto este que lhe escreve,
com a mão presa a um arrependimento, à vista de uma decisão contraditória,
impensada e inexplicável, assim você deve estar quando lhe disse que nosso
namoro terminava ali, naquele portão, na
noite de domingo em que a levei à sua casa.
Só agora me dou conta do tamanho de
minha insensatez. Diria mesmo, da minha insanidade, pois 8 anos já se vão desta minha espera insistente para que você
saísse de sua indecisão e, enfim, estabelecêssemos uma relação afetiva para a
vida inteira.
Procurei, obviamente, ir a fundo na
razão desse meu comportamento alienado e inexplicável. Será que o amor que me
inspira transbordou a tal ponto que entornou-se e caiu por terra e evaporou-se,
sem mais nem menos?
Ao sentir o peso amargo de uma decisão
incompreensível, não só para você mas, especialmente, para mim próprio, eis que
consultei um de meus amigos, que
considero mais experiente e mais sábio, na busca de uma explicação para uma
desistência fatal que jamais foi meu desejo.
E ele me explicou que os seres humanos,
muitas vezes em meio a sentimentos de índole muito fortes, acabam por
experimentar o que em psicologia se chama “ajustamento neurótico”.
Isso explica, em grau extremo, até mesmo o
fato de pessoas acabarem por eliminar o ente amado. O que ocorreu comigo,
segundo ele me explicou, foi o tipo de ajustamento neurótico conhecido
tecnicamente como da “raposa e as uvas”.
Aí me aclarou o raciocínio. Descobri que o
que me fez perder-lhe foi, nada mais nada menos do que o medo de perdê-la. A tal
ponto que, temeroso de que meus sentimentos se alçassem voos mais altos, seria
insuportável uma eventual separação, com decisão vinda de sua parte.
Agora, aqui estou. E até me acodem imagens
e injunções de dolorida poesia.
O velho relógio daqui da sala, de onde lhe
escrevo, vai a jogar sobre o chão minutos mortos, amalgamados pela minha
angústia em chegar a uma decisão tão desinteligente quanto absurda.
Só me resta esperar que você evoque os
momentos em que juntos cantamos o amor de forma tão explícita e tão evidente,
que você, tenho certeza, não alimentará qualquer dúvida de que foi, nada mais
nada menos, do que uma loucura de minha parte, própria dos que extrapolam no
amor, e perde a medida do próprio bom senso.
Receba esta carta e sinta em cada signo respingado da caneta sobre este papel, os vestígios irrefutáveis de que não pode existir um amor maior que o nosso.
Eu
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