REVISÃO DE TEXTO DE CLAUDIA SARTI


Abro mais esta exceção para aqui transpor um trabalho sobre o poema de CLAUDIA SARTI.  Ela é uma escritora que, se realmente mantiver o tempo e a paciência requeridos para o sacerdócio da literatura, pode vir a se tornar uma escritora conhecida. Ela é bem original na escolha dos temas e no emprego dos termos.

Geraldo Generoso - 




Quando Pichei  seu Túmulo

(O correto é PICHAR. Eis alguns exemplos de construção onde esse verbo incide:
verbo
 transitivo direto
1  aplicar ou colocar piche em
Ex.: pichou o piso para criar uma camada impermeabilizante
 transitivo direto
2  escrever, rabiscar (dizeres de qualquer espécie) em muros, paredes, fachadas de edifícios etc.
Ex.: pichou o nome da gangue na parede da igreja
 transitivo direto
2.1 escrever ou rabiscar dizeres políticos em
Ex.: candidatos sem consciência costumam p. os muros
 transitivo direto e intransitivo
3  Uso: informal.
falar mal de; maldizer
Exs.: a crítica pichou muito o filme do rapaz
 gostava muito de p.
Repintaram, em prateado de mau gosto; sumiram com o meu grito desesperado de socorro e saudade. Como testemunhas, bons e maus fantasmas, e os personagens do Furlanetto. Nada para mim disseram. Simplesmente apagaram. Tudo bem, foi melhor se calarem, e melhor que não ouvi qualquer comentário que denotasse falta de conhecimento de causa. E  ali ninguém o tinha.
Ninguém ali perdeu seu parceiro, pelo menos ninguém tão jovem quanto eu havia perdido. Ninguém entregara a terra o corpo do seu amor, tão moço, tão pai, tão forte.
Ninguém ali teve a vida sustentada por um anjo, anjo moreno que lentamente crescia dentro de mim.
No cemitério era comum essa cor prateada a ofuscar a vista. Burrice de uma cidade onde a incidência de luz maior do país, quando não cativa pelos tons variados e maravilhosos que tingem o céu e a Serra da Mantiqueira, agride os olhos já maltratados, de quem não consegue livrar-se de uma terrível enxaqueca.
Pichei seu túmulo com o mesmo sentimento que lhe cobri o caixão de terra, tomando em minhas mãos a enxada do coveiro corcunda, que ousava lhe entregar à mãe no meu lugar.
Pichei, como quando quis beber teu sangue já duro, para continuar em nosso amálgama profundo, sem nunca tê-lo permitido acabar.
Pichei, como quando avidamente subi nossa conhecida montanha, no primeiro amanhecer em que você já não estava conosco, para te procurar entre as nuvens daquele alvorecer cinzento.
Pichei, como quando trocava as fraldas de nossas meninas, e me alegrava com seus sorrisos que muito lembraram os teus, e pondo-me a funcionar ao menor sinal da necessidade de minha presença materna, e agora, paterna também.
Pichei  o teu túmulo, no desejo absurdo, de te fazer  entender que precisavas voltar...
Pichei teu túmulo, pra que São João da Boa Vista, e toda a gente soubesse da minha síndrome de Julieta e  fosse menos dura comigo.
Pichei teu túmulo, pra que todos vissem que  era de amor que eu sofria, e que a solidão em que a cidade me inseria era por demais cruel.
Pichei o teu  túmulo porque não queria mais ser só. Porque queria o teu abraço, teu colo... Queria que me jogasse para cima e me pegasse no ar. Desejava intensamente que tu, como antes, me puxásseis   para os galhos mais altos, os quais  eu não pudesse alcançar.

Pichei porque pichei. Sei lá porque pichei. Já que isso não passou de um grito surdo que só eu mesma escutei.

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