TEXTO DO PROF. PEDRO LEME BRISOLLA SOBRINHO

TEXTO DO PROF. PEDRO LEME BRISOLLA SOBRINHO - DE 1923
           
       O Professor Pedro Brisolla, merecidamente dá o nome á ETE - Escola Técnica de Ipaussu, da Fundação Paula Souza, e é uma referência regional, pois recebe alunos de várias cidades vizinhas, assim como estudantes de lugares longínquos fixam residência na cidade para frequentar os variados cursos que essa instituição de ensino oferece.

       No caso presente, aqui está um texto desse que foi um dos maiores intelectuais do município paulista de Ipaussu. Oriundo da cidade de Itapetininga, onde outros Brisolla seus parentes deixaram história e memória.
       A literatura (e aqui há a expressão de uma literatura em seu grau superlativo, pela pena desse grande cultor dessa arte) tem a propriedade de transmitir o que um autor sente, e seu produto é algo vivo, nascido do espírito, tecido com o coração. 
Sem nenhum demérito às demais artes ( e artistas verdadeiros não brigam entre si), sem nada diminuir da pintura e da arte fotográfica - que fazem parte do nosso cotidiano e conta com grandes talentos em tais áreas, a literatura é a  arte que revela, quando bem executada como no caso presente, um mergulho interior muito profundo. Vai além dos olhos e dos ouvidos para ver e ouvir. Alcança o mais fundo do âmago do escritor. Flui por seus dedos um misto do que pensa e do que sente. Expõe-se a si mesmo para expor o que lhe vai no mais fundo da alma.
       Obviamente, marca o estilo de um tempo em que o vernáculo se valia de mais recursos, com palavras rebuscadas. Quase artesanalmente o escritor tecia de tal forma a sua peça literária, onde cada detalhe era estudado, medido e pesado.
       É este um documento importante para os ipauçuenses. Os aqui nascidos e os que aqui aportaram como eu, ou outros que por aqui passaram só de visita. Mas deixemos que a pena ágil, sob o primor da mais fina estética literária do professor Pedro Leme Brisolla Sobrinho, os embale na história da chegada dos  primeiros bandeirantes a este solo sagrado da conhecida Flor do Vale (que é a nossa inigualável Ipaussu).


PRIMÓRDIOS DE IPAUSSU - Outrora    ILHA GRANDE
*Professor    Pedro Leme    Brisolla   Sobrinho    
( Resumo histórico escrito em 1923)

Há quarenta anos, quando ainda nestas paragens selváticas ecoava, melancólica e plangente, ao cair da  tarde ou no romper da aurora, a música do  aborígene - misto de sons de inúbia  e de boré estridentes que a grande selva bruta repetia, nota a nota, de quebrada em quebrada, até o som perder-se, a pouco e pouco, longe, no cimo azul dos montes alterosos; quando as águas do Paranapanema, ora plácidas, quedamente deslizando, ora escachoantes, revoltas, céleres correndo, a leve piroga do autóctone singrava, rápida como a seta do seu arco despedida, ou mansa, como o pato selvagem deslizando, à mercê da corrente;

quando  nestas cercanias, à hora do lusco-fusco , daqui e dali reboavam do virginal seio da floresta densa, os tétricos rugidos da onça, fragorosos, quando estas serras erguiam-se impenetráveis, alcandoradas   e hostis e a morte espreitava, solerte,  os passos do homem  ousado, que num rasgo de temeridade buscasse estes arcanos  devassar, nas garras da fera, nos dentes do ofídio, na seta do selvagem, no pútrido, fétido e letífero   exalar das estagnadas águas pestilentas  - dois homens, João Corrêa de Miranda, já falecido, e João Antonio Justino  de Oliveira, vulgo João dos Santos, residente nesta cidade, ambos naturais do Estado de Minas, chegaram ao meio dia às margens do ribeirão,  que hoje se chama ribeirão do Misael ¹  e que atravessa esta cidade, no ponto que hoje chama-se Coqueiral, e aí resolveram descansar um pouco da longa e penosa viagem, empreendida desde a vila Rio Novo, hoje Avaré, ao acaso, sem um roteiro, tendo por bússola o sol que lhes indicava o oeste - rumo ao sertão bravio.
- Misael foi proprietário do que hoje é a Fazenda São Luiz,por  onde passava até hoje o dito riacho, cortando em perpendicular a Rodovia SP-225- Dr.João Mendes Cabral Rennó.
          Por armas duas pistolas de antecarga e os dois facões,de larga lâmina com que  iam  abrindo alternadamente a picada da  mais alta, mais virgem, mais umbrosa, mais cerrada  mata.
          Dessedentaram-se bebendo daquela linfa pura, saciaram a fome, comendo dos sápidos frutos que amareleciam em  muitas árvores, e a cuja sombra amiga e protetora descansaram
          ...Com as condições físicas refeitas, o ânimo conservaram-no sempre o mesmo na garra e pujança - mais uma prova da energia, da coragem, da virilidade de espírito dos nossos antepassados, acordaram em que a viagem não fosse continuada, pois, o lugar muito os agradara e perfeitamente prestava-se para ali estabelecerem a sua   morada, ficando assim atingido o desiderato de ambos. E tratou logo cada um de construir uma choupana ² e,  acabado que foi esse serviço, retrocederam até  Botucatu, onde se    achavam suas mulheres, a fim de  trazerem-nas.
          De  regresso de Botucatu, acompanhados de suas esposas,  trazendo cada  um às costas a mudança :roupas, panelas, machados, foices e provisão em que o sal abundava, conduzido em saquinhos, trazendo João dos Santos, a mais, um   lombilho e seus pertences,  passaram, de novo em Rio Novo, hoje Avaré, vila onde morava, segundo ali o souberam, o posseiro João Delgado, de cuja posse, efetuada em 1856, faziam parte os terrenos onde haviam construído suas choupanas.
  Na sequência do histórico de ILHA GRANDE,  vem em nosso socorro, ainda, a pena do culto professor Pedro Leme Brisolla Sobrinho, com o segundo capítulo do “ Resumo Histórico, escripto em 1923”, publicado no jornal O PROGRESSO - “ Orgam Noticioso e Literario”, sendo seus Redactores:     LUCIANO SANTORO e PROF J. MASTRODOMÊNICO  ( o Prof. Júliio, ilustre personagem que emprestou seu nome à (hoje) Escola Estadual  Prof. Júlio Mastrodomênico”.. O gerente do referido jornal nesse princípio dos anos 30 foi o Sr. ERVANO MARCONDES.

ILHA GRANDE
PARTE II

Procuraram-no logo (referência ao sr. João Delgado) e, entrando em negócios, João dos Santos barganhou com ele o lombilho, que lhe custara 16$000 por 80 alqueires de mata no local escolhido, e João Correa de Miranda, a troco de um saquinho de sal, recebeu 16 alqueires de mata, no mesmo local, sendo-lhes imediatamente passadas as respectivas escrituras, que mais tarde foram registradas em Faxina ³.
          Infinita alegria deles estão se apoderou, pois agora viriam  sossegados  ocupar as terras que não mais eram simples pretendentes à posse, mas legítimos possuidores.
          Oito dias depois, com geral  espanto dos índios que, em absoluto, não os molestaram, instalavam-se as duas famílias nas duas pequenas choças, contíguas, baixas, pequeninas, cobertas de palmas de coqueiros, à beira do córrego pequenino, quieto e sonolento.
          Ocorreu-lhes, dias depois, que algum rio devia passar ao perto e - piraquaras que eram - lá se foram procurá-lo.. Depois de três horas de viagem encontram-no; era o Paranapanema, largo, possante, caudaloso e belo.
E o ponto tocado da margem, foi aquele onde se erguia, em pleno  meio das águas, majestosa e bela, vasta e formosa ilha, que logo lhes sugeriu o nome: Ilha  Grande, a dar a este formoso, ameno e poético recanto
          Dita ilha constitui um dos mil encantos naturais deste município. É grande e, sobre ser vasta, é ainda de uma beleza sem par.
³ - Faxina é a atual cidade de Itapeva.

²- Segundo depoimento de José Roberto de Oliveira, neto de João Antônio Justino de Oliveira  ( JOÃO DOS SANTOS),  este, em companhia de João Correa de Miranda fazia-se acompanhar de um grupo de escravos. Estes certamente auxiliaram  no trabalho mais pesado  de construção das duas primeiras casas (choupanas) em Ipaussu. (Texto reproduzido no vernáculo atual do jornal O PROGRESSO- “Orgam Noticioso e Literario” -  N.02-Ipaussú - 26 de janeiro de 1930 -pg. 1-2

Um comentário:

  1. Valéria Mello de Campos Laranjo Quadros2 de junho de 2018 às 16:18

    João Antônio Justino de Oliveira (JOÃO DOS SANTOS) é meu bisavó. Que privilégio poder saber mais sobre nossos antepassados. Que belo trabalho escrito! Parabéns!! Que Deus o abençoe, Generoso.

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