Do contra mesmo: o que eu não aprendi nos primeiros cinco meses em que estive desempregada – e deveria ter entendido na primeira semana em que me vi naquela situação.
Com essa chamada, minha intenção é deixar claro que o período em que mais perdi tempo na vida foi, ironicamente, aquele em que eu mais tive tempo de sobra. Engraçado que só me dei conta quando o cenário estava prestes a mudar, semanas antes de eu recomeçar a trabalhar.
Aos 23 anos, jornalista recém-formada e entusiasta de redações, me vi confusa e desiludida. A revista para qual eu trabalhava fechou. Essa é, prometo, a frase mais dramática deste texto, mas não poderia deixar de dizer. Porque o fato de eu ter tomado consciência dessa minha desilusão, que tem a ver com as mudanças pelas quais a comunicação tem passado, me ajudou muito.
Claro que considero aqui o meu contexto e os meus dramas, que certamente não são os de outras pessoas que se viram na mesma situação, como as que têm famílias para sustentar, por exemplo. Tentarei, no entanto, manter uma visão não tão restritiva.
Nos últimos meses, a maioria dos artigos que li sobre desemprego seguiam de alguma forma a mesma linha. O que aprendi quando perdi o emprego, como dar a volta por cima, 10 coisas para fazer quando se quer mudar de área, como escapar da crise. Em comum, sustentavam aquela ideia de “você não está sozinho”, “aproveite oportunidades”, "leia um livro", “esse momento vai passar”.
Alguns artigos eram bons, tá? Mas não contemplavam o que eu estava sentindo. Até porque as coisas não estavam nada claras para mim, estavam turvas.
Não saber – aliás, sequer precisar – diferenciar sábados e domingos dos demais dias da semana é terrível. Arrisco dizer que esse negócio pode ser depressivo. Por mais inconcebível que pareça, não ter problemas pode ser um problema! Porque você acaba inventando um. E essa história de não ter objetivos a curto prazo se tornou um cargo pesado! Parafraseando Milan Kundera, a minha insustentável leveza do ser era não trabalhar, não ter responsabilidades, senão as que eu mesma me prescrevia, era ser leve, leve demais. Tão leve que se tornou um cargo.
Apareceram, sim, alguns serviços de frila, inclusive novas oportunidades em jornalismo que eu nunca tinha experimentado, bacana, mas tal eventualidade não me bastava. Por algum motivo, buscava algo mais consistente.
Foi então que em um momento de despretensiosa epifania, me flagrei lembrando de um dos meus pensamentos mais recorrentes em épocas em que me dividia entre trabalho, faculdade, curso paralelos, vida social e esportes: falta-me tempo nessa vida! Não tenho tempo. Quem nunca pensou isso, não é mesmo?
Bobagem.
O que me faltava, como vim a perceber cada vez mais claramente, era organização para administrar meu tempo. Não era possível ter, no mínimo, oito horas a mais por dia, tempo este que usava para… trabalhar, e continuar sem tempo para fazer as coisas quer realmente queria. Com o dobro de tempo, minhas pendências continuariam as mesmas. Quer saber? Está tudo na nossa cabeça, esteja você desempregado, aposentado ou trabalhando em três lugares diferentes.
Eis aí um dos maiores desafios de nós, cidadãos do século XXI: habilidade para gerenciar sábia e racionalmente as próprias lacunas de tempo.
Banal, né? Claro que é. Acontece que as coisas mais simples são as mais fundamentais. E por isso são talvez as mais difíceis de tomar consciência.  
Então veio à tona a primeira pergunta esperta que me fiz em meses de sofá: se, quando eu estudava, trabalhava, praticava esporte, mantinha vida social e minhas atividades de lazer simultaneamente, (a falta de) tempo era um problema, agora, desempregada, com tempo excedente, o que eu posso fazer?
Até aquele momento, uma espécie de medo somado à ansiedade de não saber quando aquele cenário ia mudar me consumia despropositadamente. É uma sensação que poderia ter me ocorrido também enquanto trabalhava. Porque, bem, como descobri, o problema não era a ausência de rotina, era outra coisa.
Comecei, então, a desengavetar atividades, pendências e meros desejos que eu não havia feito nos últimos anos por não estar dentro das minhas prioridades, por inconveniência ou preguiça mesmo.
A lista era longa, viu?  
Maneirei as maratonas de séries e, devidamente descansada, corri minha primeira meia maratona ao ar livre. Li livros que já tinham perdido a esperança em mim, passei tardes à toa e sem culpa com a vovó. Completei 24 anos. Retomei o francês e comecei a estudar espanhol sozinha. Organizei bravamente o Gmail, inventei um novo método de passar roupas, visitei amigos que havia prometido visitar e viajei a cidades que mal sabia que existiam. Até me candidatei, impulsivamente, a um estágio, que mantive por duas semanas – por que não? Liberdade!
O antídoto daquele mal de inutilidade era simples: preencher lacunas com muitas, muitas coisas úteis. Criar uma disciplina. Nem se fosse do zero. Nem se fosse só para mim. Uma disciplina que não precisava ser espartana, não, e nem de um chefe para supervisionar. Então, finalmente, digo aquilo que não aprendi enquanto desempregada e que tento praticar agora, felizmente empregada: saber lidar com o excesso de tempo é mais importante do que saber lidar com a falta dele.