A Jesus.com nos explica muita coisa
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É muito provável que a única coisa certa na política, particularmente nas democracias, é que o poder é exercido por uma minoria fortemente organizada (Guglielmo Ferrero). No mais, “de política não sabemos quase nada; é um enigmático mistério e o ofício mais inexato do mundo” (D. Innerarity). Todo governo tem suas oligarquias governantes (as que reinam) e “co-mandantes” (as que influenciam, normalmente por meio do dinheiro). Ora são rigidamente hierarquizadas ou verticalizadas (nas ditaduras e nos populismos duros, agudamente personalistas: ditaduras brasileiras, governo cubano, venezuelano ou norte-coreano etc.), ora são mais horizontalizadas (nas democracias populistas mais abertas, como a de Vargas – 1950-1954 – e a lulista, que foram “pai dos pobres” e “mãe dos ricos”).
Nas democracias, as piores oligarquias dominantes são as que reúnem o descaramento da corrupção, do fanatismo religioso e do autoritarismo. Eduardo Cunha é a síntese (im) perfeita dessa equação tripartida. Mas ele não é fruto do nada. Samsung, Mitsui e muitas empreiteiras “compraram” seus favores. Sem essas propinas não haveria a “jesus. Com”.
Seu processo de cassação na Comissão de Ética anda como tartaruga, mesmo depois de 7 delações contundentes. Seus sectários na Comissão são cínicos. Sua empresa jesus. Com é a cristalização das oligarquias que mais estão crescendo no Brasil. Pior: possuem (do ponto de vista do domínio do poder) um futuro promissor. Constituição, democracia, direitos e liberdades individuais, pensamento secular, desapegamento público ao Ser Supremo, racionalidade, valores republicanos ou da revolução francesa… tudo do Iluminismo e da crença política do século XVIII está sendo enterrado nos últimos séculos. Os populismos. Com, corrosivos e destruidores dos pilares da democracia, são eleitoralmente arrebatadores.
A organização e as influências recíprocas conferem êxito e superioridade às oligarquias (os carteis na Petrobras constituem prova inequívoca). Com a ajuda dos aparatos reprodutivos das respectivas ideologias (igrejas, escolas, fábricas, meios de comunicação etc.), governam com assustadora facilidade[1]. Mas a política autêntica não é só poder (não é só governo), é também moralidade. Governos e Estados corruptos (cleptocracias), ainda que democráticos, não possuem legitimidade. Acontece que legitimidade nunca foi um grande problema para as oligarquias mais atrasadas (com democracias menos educadas, menos participativas, menos cidadãs, menos conscientes).
Não vivêssemos numa democracia só formal, oligárquica e cleptocrata, é evidente que Eduardo Cunha, que denigre a República com sua escancarada corrupção (tem contas secretas nos EUA, na Suíça e em Israel), já não seria presidente da Câmara há muito tempo. Mas ocorre que o Judiciário ora atua como poder jurídico de controle (cortando os abusos dos demais poderes – no mensalão foi assim), ora age como membro das oligarquias (que são castas que se ajudam mutuamente, facilitando a prescrição de um crime, por exemplo).
Afirma-se que o STF ainda não deu “cartão vermelho” para a presidência de Cunha por causa de Renan Calheiros (sendo ambos próceres do arrivista PMDB). O presidente do Senado está na iminência de também se converter em “reú” no STF (sem contar outros 9 inquéritos em andamento). O que se decidir para um tem que valer para o outro. Efeito dominó. Aí estaria o problema. As amarras das oligarquias tornam as nações fracassadas.
Cunha poderia ser eliminado da presidência da Câmara com mais facilidade (aplicando-se o art. 86 da CF para todos que estão na linha sucessória presidencial). Renan, não, porque ele seria considerado “muito importante” no tabuleiro da política (leia-se da cleptocracia) brasileira (tem trânsito em todos os políticos, de esquerda ou de direita, polutos ou impolutos, teúdos ou manteúdos, de mãos limpas ou sujas). A denúncia que o PGR ofereceu contra ele está tramitando no STF há 1.200 dias. E nada. Só anda de lado (como caranguejo). Para frente é que não vai. É ele que daria “certa racionalidade” ao labiríntico esquemão oligárquico da República brasileira.
Quando o Judiciário pensa assim, é claro que também ele está cumprindo o indecoroso papel de “correia de transmissão” da engraxada cleptocracia. Venalidade do mal. Vendo o funcionamento camarada das oligarquias (dos poucos que são os donos do poder), sabe-se a razão da restrita e precaríssima escolaridade do povo brasileiro (menos de 8 anos). As peças desse tabuleiro se casam. A jesus. Com sintetiza e facilita bastante a compreensão do funcionamento das nossas oligarquias.
[1] Ver NEGRO PAVÓN, Dalmacio. La ley de hierro de la oligarquia. Madrid: Encuentro, 2015, p. 13-14.
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